13 Fevereiro 2018

Corrigir uma situação injusta para os transformadores de caju do Burquina Faso

O setor do caju do Burquina Faso foi remodelado num esforço considerado de prioridade nacional

Investigação e desenvolvimento para este artigo disponibilizados por Hang T. T. Tran, Coordenadora Principal do Secretariado Executivo do QIR.

O setor do caju do Burquina Faso está a atravessar uma remodelação drástica.

Desde a reorganização que teve lugar em 2015 por intermédio de uma associação interprofissional designada por Comité interprofessionnel de l’anacarde du Burkina (CIA-B) – apoiada pelos parceiros de desenvolvimento, o setor privado e os esforços do governo –, o setor está agora numa fase de crescimento e de otimização.

Antes desta iniciativa, as 10 fábricas de caju deste país africano conseguiam transformar apenas 2,6% da sua capacidade. O setor enfrentava a concorrência de um “mercado negro” que exportou todo o caju cru do país nesse ano, deixando as jovens fábricas sem material com o qual trabalhar, refere Hang Tran, da equipa de coordenadores principais do Quadro Integrado Reforçado (QIR) da Organização Mundial do Comércio. Outros países africanos, como a Costa do Marfim, enfrentaram dificuldades semelhantes.

Esta iniciativa interprofissional reuniu agentes que trabalharam em conjunto ao longo de toda a cadeia de valor, desde a transformação à comercialização. Liga fornecedores qualificados de matéria-prima ao mercado internacional, ao mesmo tempo que reforça as capacidades de um conjunto de “unidades de transformação” em regime piloto e que dá formação a membros do setor sobre as melhores práticas de fabrico e modos de cumprimento das normas.

Setor importante no país, a transformação de caju cru cria empregos e permite que o produto possa ser exportado por um preço mais alto, proporcionando rendimentos mais altos a agricultores, transformadores e exportadores. Um Estudo de Diagnóstico sobre a Integração do Comércio (EDIC) do QIR comprova estes dados. O Governo do Burquina Faso elegeu a indústria do caju como setor de prioridade nacional.

Durante uma entrevista com o Diretor Executivo do Secretariado Executivo do QIR em Buenos Aires, à margem da Conferência Ministerial da OMC, o Ministro do Comércio, da Indústria e do Artesanato do Burquina Faso, Stéphane Wenceslas Sanou, afirmou que o seu país pretende duplicar a sua produção de caju até 2020 tendo em vista a contribuição do setor para a melhoria dos rendimentos e criação de empregos.

À medida que a procura mundial de caju cresce, especialmente na Índia e na China, os nossos agricultores, transformadores e exportadores de caju têm de estar aptos a tirar proveito dos benefícios. Mas o setor foi fragmentado entre a produção, a transformação e a comercialização, afirma o Sr. Paulin Zambelongo, Coordenador da Unidade Nacional de Implementação do QIR (UNI) no Ministério do Comércio do Burquina Faso. “Embora a exportação de caju cru também gere empregos e rendimentos, o aumento da capacidade de transformação do Burquina Faso contribui para elevar a prosperidade da indústria transformadora no país”.

Foi com base neste pressuposto que os principais agentes decidiram colaborar, com o apoio técnico e financeiro de vários parceiros e do governo, para reforçar as ligações ao longo da cadeia de valor e aumentar as contribuições do setor para a economia do Burquina Faso.

O QUE É UMA ASSOCIAÇÃO INTERPROFISSIONAL?

Essencialmente, uma associação interprofissional é uma instituição que congrega os vários operadores de um setor, como produtores, transformadores, comerciantes, etc., ao longo de toda a cadeia de valor. 

Quando funciona corretamente, um mecanismo deste tipo pode reforçar as transações internas e disseminar informações estratégicas sobre aspetos como a gestão do abastecimento, as normas de qualidade do produto e a partilha do valor acrescentado. Um mecanismo interprofissional ajuda os agentes de toda a cadeia de abastecimento a implementarem os resultados das últimas investigações e pode facilitar as relações entre o setor privado e as agências governamentais. 

Apesar de existir um forte desejo dos agentes de todo o setor do caju do Burquina Faso de trabalhar em conjunto, verificou-se a necessidade de um grande esforço para estabelecer a vertente interprofissional no setor, como salienta Hang Tran.

Apoiámos os agentes na formulação de um plano de trabalho, reforçámos as capacidades do pessoal e fornecemos equipamentos”, declara.

Este aspeto ajudou a associação interprofissional a trabalhar em conjunto em áreas como o cumprimento das normas internacionais de higiene até à garantia da existência de matéria-prima suficiente com que os transformadores possam trabalhar”.

VOLTAR PARA CASA

Minata Kone, a primeira e atual presidente do CIA-B, e Vice-Presidente da African Cashew Alliance (Aliança Africana do Caju), conhece demasiado bem os desafios que o setor do caju do país enfrenta, bem como o trabalho necessário para desenvolver a vertente interprofissional no setor. Quando o QIR começou a trabalhar com Minata Kone, em 2015, a sua fábrica de transformação de caju via-se impedida de trabalhar porque não havia matéria-prima disponível para comprar.

A sua atividade teve início em 2003: ao fim de 15 anos a trabalhar no Ministério da Agricultura, Minata Kone decidiu que era altura de começar um novo desafio. Durante anos a mãe pedia-lhe que voltasse para casa e iniciasse uma plantação de caju num pequeno terreno e Minata Kone acabou por concordar.

Não havia muitos empregos em Banfora, uma cidade no ocidente do Burquina Faso onde Minata Kone crescera. Tal como muitos jovens, deixara a sua cidade natal para conseguir melhores oportunidades na capital do país.

Tendo testemunhado o potencial de exportação e o valor acrescentado do caju transformado, estabeleceu a Industrial Cashew Processing Society in Burkina Faso (SOTRIA-B), que transforma caju cru em miolo de caju, manteiga de caju e farinha de caju. A sua fábrica foi a primeira empresa privada do Burquina Faso a transformar caju. No entanto, a procura e oferta limitadas de matéria-prima dificultavam o arranque da empresa. 

A situação começou a mudar quando Minata Kone iniciou os seus trabalhos com o QIR, no início de 2015. As ações de formação e o fornecimento de equipamentos de higiene permitiram que a sua empresa aumentasse a qualidade do produto e cumprisse as normas de exportação.

A participação em feiras internacionais permitiu-lhe estabelecer ligações com novos mercados e os estudos de mercado do QIR abriram novas perspetivas que a inspiraram a diversificar os seus produtos.

Melhorei bastante: aprendi a estabelecer contactos, adquiri competências de gestão e defini a visão e a estratégia da minha empresa. Estas experiências proporcionaram-me confiança e criatividade”, afirma Minata Kone.    

A SOTRIA-B, que só produzia caju cru em 2006, oferece agora ao mercado caju torrado, pastas de caju, óleo de caju, sabonetes de caju e outros produtos. A empresa tem novos compradores de França, Bélgica, Ásia, Marrocos, Argélia, Costa do Marfim e Estados Unidos. 

O valor de exportação da SOTRIA-B aumentou 63% num só ano. O caju é agora o terceiro principal produto de exportação do Burquina Faso, depois do algodão e do sésamo. 

As vendas no mercado interno também cresceram significativamente, em especial para os estudantes. Para satisfazer esta procura, a empresa abriu mais lojas no Burquina Faso e empregou 300 trabalhadores, 260 dos quais são mulheres.

MULHERES NO COMANDO

As mulheres representam mais de 90% da força de trabalho no setor do caju do Burquina Faso, pelo que não é de surpreender que Minata Kone tenha construído a sua empresa com base na autonomização das mulheres locais, levando-as a tornarem-se empreendedoras respeitadas nas suas comunidades.

Assisti a muitas mudanças positivas nas vidas dos meus empregados”, afirma Minata Kone.

Quando comecei, a maioria dos empregados vinha a pé para o trabalho. Alguns anos depois, comecei a ver muitos deles a chegar de bicicleta. E hoje a maioria desloca-se de mota e só alguns de bicicleta. Dispõem agora de meios mais económicos para assegurar o seu transporte”.

A empresa financiou a construção de um infantário, que contribuiu para manter empregadas qualificadas e com formação na empresa.

E, graças a um pequeno crédito disponibilizado por Minata Kone, muitas mulheres iniciaram pequenos negócios paralelos comercializando vestuário, bijutaria, alimentos e outros produtos artesanais.

Isto significa que todas as mulheres possuem competências empresariais. Precisavam apenas de ser inspiradas por um modelo a seguir e de receber uma ajuda inicial e do ambiente adequado para começar”, afirma.

O FUTURO DO CAJU DO BURQUINA FASO

Agora contamos com os esforços conjuntos de outros agentes do setor do caju para que o incipiente setor de transformação do caju no Burquina Faso alcance o caminho do desenvolvimento sustentável”, declara Minata Kone.

No entanto, há ainda muito trabalho a fazer. As partes interessadas têm de aumentar a oferta de matéria-prima e tornar a eletricidade, a maquinaria e o processo de embalagem mais acessíveis em termos económicos, ao mesmo tempo que estabilizam o mercado interno na área do miolo de caju. Minata Kone também tem a ambição pessoal de investir em novas linhas de produtos e instalações de embalagem e de comercializar os produtos da SOTRIA-B na Internet.

Mas, tendo em conta que o Ministério do Trabalho procura atualmente introduzir uma quota nas exportações de caju, o futuro parece promissor para os produtores, transformadores e exportadores de caju do Burquina Faso.

Acredito que, graças às estruturas de apoio que construímos e aos esforços continuados do governo para melhorar o clima de investimento, poderemos elevar o setor de transformação do caju no Burquina Faso ao próximo nível de desenvolvimento e oferecer empregos mais decentes às mulheres”, declara Minata Kone.

Para mais informações sobre esta história, contacte Hang T. T. Tran, Coordenadora Principal do Secretariado Executivo do QIR.

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